Investigador defende mais tempo para pais estarem com os filhos
"As crianças já passam muito tempo na escola, ao contrário do que
acontece noutros países europeus", disse
à agência o especialista, para quem o
importante é discutir um novo modelo de organização social do tempo de trabalho
dos pais, que reforce o tempo passado em família.
Para o
catedrático da Faculdade de Motricidade Humana da Universidade de
Lisboa, os pais precisam de ter mais tempo para os filhos e as
crianças precisam de mais espaço para brincar e estar em contacto com a
natureza.
A posição surge a propósito da intenção do governo, inscrita na proposta de
Orçamento do Estado, de alargar "a escola a tempo inteiro" a todo o
ensino básico, ou seja, até ao 9.º ano.
"Os currículos hoje estão a ser
demasiado rigorosos quanto ao número de horas exigidas pelo sistema de
educação", afirmou, defendendo que sobra "muito pouco tempo para
criar um equilíbrio" entre o que é espontâneo e o que é organizado.
"Em
muitos países onde estes estudos existem, os horários de trabalho têm mais
alguma flexibilidade. Por exemplo, pode-se começar a trabalhar mais cedo e sair
mais cedo, os pais às 16:00 saem e vão buscar os filhos à escola e têm mais
tempo em família", indicou.
O que está em causa, sublinhou, é
"uma repartição do tempo entre a família e a escola", é a criança ter
mais espaço natural com os amigos, "poder correr mais riscos, ter mais
autonomia, mais capacidade adaptativa".
Segundo
Carlos Neto, as crianças estão hoje sujeitas a um nível excessivo de
"sedentarismo, analfabetismo físico e superproteção". As atividades
extracurriculares, frisou, "não compensam o facto de não se subir a uma
árvore ou a um muro, de andar de bicicleta ou de patins".
Cair,
escorregar, equilibrar-se, são atividades que "devem fazer parte da
adaptação ao mundo", sustentou: "As crianças têm hoje super agendas,
é preciso suavizar isso".
Neste
sentido, o catedrático defende uma discussão em torno de uma nova
organização social do tempo, que contemple o tempo escolar, laboral e familiar.
"É preciso audácia política para fazer isto".
A
experiência de 40 anos de trabalho com crianças levou-o a concluir que o tempo de recreio é fundamental
para a saúde mental e física da criança. "As crianças e os jovens não têm
margem para a descoberta livre, com experiências audazes, correndo riscos em
função de situações imprevisíveis, por forma a ampliarem competências motoras,
sociais e emocionais imprescindíveis à sobrevivência no futuro", lamentou.
De
acordo com Carlos Neto, existe um ambiente "excessivamente
institucionalizado e um tempo disposto com atividades muito padronizadas",
que contraria a natureza ativa e as necessidades humanas de brincar e
socializar livremente.
"As vivências de um corpo em ação
permanente são fundamentais para uma infância feliz e empreendedora no futuro
e, por isso, se não existirem têm repercussões colossais na construção do ser
humano", alertou o investigador.
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